terça-feira, 12 de agosto de 2008

A viagem de Lídia parte 8

Finalmente, Lídia está prestes a embarcar. Planeja uma cena e a realiza. Espera que os funcionários da companhia aérea comecem a demonstrar agitação. Espera que seu nome seja pronunciado pelo alto-falante. Espera que seu nome seja pronunciado uma vez mais. Desarruma um pouco os cabelos e começa a correr. Ao chegar no portão de embarque, simula uma expressão mista de desespero e agitação. Pede mil desculpas, exibe uma expressão exageradamente simulada de constrangimento. Os funcionários começam a se sentir culpados. Simula um mal estar, um choro e diz que soube agora, instantes antes de partir, que um grande amigo morreu num acidente de automóvel. Chora de um modo quase autêntico. Afinal, consegue fazer com que todos os funcionários se sintam culpados. É conduzida, gentilmente, por um deles até a porta do avião. Dentro do avião, é gentilmente conduzida até seu assento, por uma comissária de bordo visivelmente emocionada. a comissária acomoda suas bagagens de mão e imediatamente, surge, das mãos de outra comissária, um copo de água. Lídia é consolada e há um rumor de curiosidade geral no avião. Lídia sente um prazer imenso mas exibe uma expressão cansada e triste. Aproximadamente, nove horas de vôo. A tripulação se prepara para a decolagem enquanto Lídia examina o seu território. Está exultante, porque ficou na poltrona do meio, ao lado de um homem que visivelmente é limpo, meia idade e quase bonito. Este homem está agitado e Lídia sabe que dentro de poucos minutos ele vai querer consolá-la. Exibe um olhar perdido e aparenta estar muito alheia. Finge não ser capaz de afivelar o cinto de segurança. Ele a ajuda. Lídia vê a aliança. Vê também as unhas roídas. Vê também a qualidade da camisa. Vê também o modelo do celular que ele desliga. No momento da decolagem, Lídia simula medo. E assim, dissimulada, pega na mão do homem limpo, quase bonito. E aperta sua mão como o faria uma mulher que de fato tivesse medo de voar. Retira a mão, rapidamente, para que este homem julgue existir em Lídia algum recato. Força o choro, em silêncio. O homem se agita ainda mais. Delicadamente, Lídia tenta retirar do rosto duas lágrimas. O avião está subindo e Lídia segura a pequena medalha de ouro, com uma santa escolhida para estas ocasiões. O homem não suporta mais esperar e pega a mão de Lídia, coloca entre suas mãos e a conforta. Diz, num tom de voz nervoso e compassivo, que não tenha medo. Lídia desata o choro ensaiado, fala do medo, fala da morte em geral e da morte do melhor amigo. O avião estabiliza o vôo, os avisos de afivelar os cintos são apagados e Lídia diz ao homem bonito que precisa lavar o rosto. No sanitário, refaz os planos. Sabe que está tudo muito bem encaminhando, e sabe que neste caso, a sorte está a seu favor. Apesar de não acreditar em nada, agradece ao que quer que seja o fato de não haver crianças próximas ao seu lugar. Escova os dentes, usa o fio dental e coloca um pouco mais de perfume em lugares estratégicos. Volta ao seu lugar, de olhos baixos. O homem a recebe com um sorriso terno. Lídia detesta a demora das viagens longas e está animada pois sabe que não sentirá tédio algum. A conversa flui entre eles. Lídia se dispõe a ouvir. Discutem até a preferência por alguns vinhos, pratos, sobremesas. Escolhem pratos diferentes, para partilhar. Há uma intimidade se estabelecendo. Lídia diz ter esquecido o casaco e de fato sente muito frio. O homem oferece o casaco para Lídia, que aceita com ar ingênuo e agradecido. Este homem está cansado, viaja a negócios e odeia aeroportos. Mas fala muito pouco da vida familiar. Felizmente, há uma zona de turbulência. Dessa vez, Lídia encosta a cabeça no seu ombro. Mais uma vez, ele toma a mão de Lídia entre as suas. E faz o gesto que a deixa exultante: beija delicadamente a mão macia de Lídia. Antes das preparações para a noite, Lídia vai ao sanitário, depois dele. Lídia usa uma saia de comprimento médio e meias finas. Vai precisar de um cobertor a mais. As luzes são apagadas. Lídia começa a trabalhar. O homem quase bonito respira de modo alterado. Lídia gosta muito do cheiro que este homem exala, desde o pescoço. Lídia quase se entrega aos beijos deste homem. Lídia respira de modo alterado quando as mãos quentes deste homem apertam seus seios. Lídia quase não respira quando as mãos deste homem alternadamente tocam seus seios, descem a sua calcinha, tocam sua vagina úmida. O homem quase bonito tem gestos carinhosos. Seus dedos hesitam. Mas Lídia trabalha bem com a língua na boca saborosa deste homem que enfia delicadamente, um dedo na vagina de Lídia. Há um certo desconforto, apesar da poltrona do corredor estar desocupada. Uma passageira solicita a presença de uma das comissárias. Eles se recompõem. Os próximos movimentos precisam ser delicados. Lídia quer prender este homem em sua teia. E finge arrependimento, diz palavras românticas, diz que tem medo de se apaixonar, diz que está muito carente, diz que perdeu seu melhor amigo. Os beijos ficam mais cálidos, o abraço do homem quase bonito faz Lídia adormecer por alguns instantes, apoiada em seu ombro. Lídia desperta. E se afasta. Precisa dormir um pouco. Mas o faz apertando a mão quente do homem que beija tão bem. Revezando excitação e extrema ternura, o homem mantém toda sua atenção em Lídia. De manhã, ela se recompõe, finge recato, declara-se recatada. E declara o desejo. Trocam telefones e endereços eletrônicos. Lídia pede a ele que agora finjam que não se conhecem. Que na área de bagagens e alfândega, se afastem. Mas implora que se encontrem novamente, em outro aeroporto.

3 comentários:

Anônimo disse...

Eliana, nossa Sherazade baianinha,
faiz favoire, esclareça (se possível em desenho) alguns aspectos ainda nebulosos:

1) É apenas uma ou mais de uma viagem?

2) Se for apenas uma, este seria o episódio inicial?

3) O homem quase (almost, rssssss) bonito é algum dos que já apaeceram em episódios publicados anteriormente?

A crítica literária mando depois, por mail...

Anônimo disse...

Êta Lidia danada, que adora brincar com os homens cheirosos.
Beijinhos, flor!

Eliana Mara Chiossi disse...

RM

a narrativa tem saltos temporais... Há flashback e outros torneios...
Mas Lìdia está começando a primeira viagem...
veja, primeiro Marcos, depois o massoterapeuta. finalmente, ela embarca...
e vai começar a viver apenas em aeroportos...
os motivos??'
assista ou leia os próximos episódios

sim...
mas não é o início da história...

e o homem, é outro

tem o marcos, o massoterapeuta e este...ainda sem nome...

beijos