sábado, 15 de março de 2008

Gaze

A cicatriz tem mais força que a pele intacta. Quero as marcas no teu corpo. Quero ver inscrita nos seus olhos a memória dos acontecimentos. Hoje dói, e dói muito. A morte não vem, e se vier, não haverá dia interrompido. Tudo trabalhará na manutenção da seqüência fixada. Amanhã dói menos, dor mais conhecida, tolerada. E quando esta dor cessar, isso será a concessão para que venham outras dores. Vai doer, sempre, além dos intervalos em que a ânsia, o gozo, a honra, a festa, os barcos, as viagens, os livros, os filhos, os objetos de estimação. Até que, na ocasião da morte, boa morte ou morte desajeitada. Encerramento do espetáculo doloroso, aclamado em aplausos e lágrimas. Cordão umbilical retomado, colar de mágoas. A travessia de maravilhas suspensas, entre o vôo de um inseto breve e movimentos sazonais. Acima do solo da tristeza, os saltinhos assustados da alegria.

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